sexta-feira, 2 de abril de 2010

4X1 + dia de festa do teatro nordestino!!!!

Essa é minha ultima semana no projeto. Infelizmente, não poderei acompanhar o grupo na Bahia. Minhas férias na universidade terminam esse final de semana e segunda-feira, já tenho que estar de volta para assumir as aulas de Interpretação e as funções na Coordenação de Cultura da UNIRIO. Adoro dar aulas e sou apaixonada pela UNIRIO desde que entrei lá como aluna aos 17 anos de idade. No entanto, deixar o Ser Tão dói fundo no coração. Passei a semana inteira mexida, reflexiva, tentando me acostumar com a idéia de ir embora e tentando re-significar essa despedida. Viajar sempre mexe muito com a gente. Viajar em um projeto assim mexe ainda mais. Pensar quantos desafios o grupo tem pela frente e saber que não vou estar com eles é sofrido. Em menos de um mês, temos a produção da II Mostra de Teatro de Grupo, projeto que idealizei em 2008 e do qual tanto me orgulho. Desta vez, o grupo convidado é o querido Bagaceira de Fortaleza(CE), que vem com quatro espetáculos do repertorio, duas oficinas, mesas redondas e bate papo. E, claro, aquele astral divertido deles. Logo em seguida, temos o Fenart, as apresentações e oficinas do FMC, o caderno de apontamentos para ser publicado, a turnê com “Vereda da Salvação” por nove cidades através do edital BR de Cultura, e o maior desafio de todos, a nova montagem do grupo – o Coronel de Macambira, de Joaquim Cardozo – outro espetáculo de rua.

Bom para eles, que tem uma agenda repleta. E assim, na marra, vão amadurecendo!

A parada em Sergipe foi um grande alivio para todos. Foram sete dias em um mesmo hotel. Já estávamos todos exaustos de tanta mudança de quarto, do eterno sobe e desce das malas pesadas, da confusão com tantos números diferentes na cabeça se misturando.

Em Sergipe, Galego foi o produtor local, e teve a feliz idéia de deixar o grupo a semana toda em uma confortável pousada perto da praia para cumprir o calendário de uma apresentação em Laranjeiras, uma em São Cristovão, e duas em Aracaju. Semana Santa. Época difícil. Muita gente viajando, e um pouco de ansiedade da nossa parte de ter um dos membros do grupo na responsabilidade da produção local.

Mas a parada na pousada ajudou e o clima foi ótimo. Cada um fez seu horário, saiu, dormiu, descansou e o grupo se dividiu. O lugar agradável fez a gente esquecer o trauma da péssima hospedagem de Arapiraca (que nos obrigou inclusive a mudar de hotel no terceiro dia, pois os quartos não tinham nem portas nos banheiros... e, ainda assim, muitos nem banheiro tinham!)

Sábado foi dia de chegada e descanso.

Domingo: Dia de apresentação em Laranjeiras, uma cidade histórica a 30 km de Aracaju. Sede do novo curso de Teatro da Universidade Federal do Sergipe. Dia de procissão na igreja. O acordo feito com o padre era o de que começaríamos a peça logo após a missa. Impactante ver a chegada daquela procissão, com todos sacudindo seus ramos e entoando cantorias, acompanhado do órgão da igreja ( tipo único no Brasil), microfonado para toda a praça. Juro que pensei comigo: “É hoje que a gente se lasca! Esse povo vai botar a gente pra fora daqui correndo!” O Neto (motorista) pensou a mesma coisa, pois chegou no meu ouvido e disse: “ Você alguma vez já correu 30 km?” Logo pra quem...fiquei olhando para a cara dele com espanto. E ele finalizou: “Porque quando expulsarem a gente daqui eu me mando com o ônibus, e vocês que voltem a pé para Aracaju!”

Fernando estará de volta amanhã após sete dias de ausência, enquanto era debatedor e oficineiro da II Mostra de Teatro do SESI, em Alagoas. Bom! Assim eu posso relaxar mais e deixar o trabalho pesado para “os garotos”.

Acabada a missa, estávamos lá prontos para mais uma apresentação. Ponto de apoio perto, ajuda da prefeitura, praça lotada e, mais uma vez (já tá virando moda!) a chuva nos pega no inicio da terceira cena da peça. Imagem para ficar gravada na memória. Aqueles guarda-chuvas se abrindo, sabe-se de lá de onde eles surgiram, e eram tantos! Aquela platéia toda abrigada em baixo das sombrinhas. Mas nós não tínhamos guarda-chuvas. E a chuva apertou, e para a peça, espera a chuva passar, volta a peça. Uma pena! Pois dessa vez a volta foi mais difícil. Os atores entraram frios e custaram a recuperar o ritmo do espetáculo. E assim foi. Um pouco sofrido. Ainda não foi dessa vez que repetimos a qualidade da apresentação de Maceió, mas seguramos até o fim. A resposta da platéia é sempre calorosa. O que é um pouco preocupante. Todos já perceberam que a peça funciona mesmo quando não estão no seu melhor. O debate tinha alguns alunos do curso da UFSE e o papo foi curto por causa da chuva que voltou, porém, interessante e proveitoso.

Segunda Feira: Dia de folga. Cada um foi para um canto. Afinal, a gente está precisando mesmo se separar um pouco! Galego enrolado que só com milhões de coisas para resolver da produção de São Cristovão. Neto foi comprar maquiagem, Isadora resolver figurino, Calina correr atrás da divulgação na imprensa. E eu fui fazer uma coisa que não fazia há tempos! Fui ao cinema. Fui sem muita fé, descrente da programação local, mas acabei dando uma sorte danada. Peguei a única sessão do filme “Fita Branca”, vencedor de Cannes, um filme intrigante em preto e branco, que abre uma serie de questões na cabeça da gente, e não se preocupa em fechar nenhuma. Não que isso seja um problema. Pelo contrário. Você sai do cinema agitada, inquieta, pensando no filme, e querendo conversar. Apesar de não tocar em nenhum momento no nazismo, o filme nos faz pensar o tempo inteiro: “Ahhh, então foi essa a geração que alguns anos depois sustentou Hitler e suas teorias esquizofrênicas!”

Passar o dia sozinha foi ótimo! Além do mais nesses tempos que minha cabeça não para de azucrinar. Restaurante japonês, e depois uma passagem pela livraria da qual sai com uma leitura rasa, uma média e uma profunda para ajudar nessa fase de confusão mental.

Terça- feira: apresentação em São Cristovão. Dia lindo. Cidade linda. A quarta mais antiga do Brasil. Prestes a se tornar patrimônio da humanidade. Aquelas ladeiras, com suas ruas estreitas, as várias igrejas, as casas antigas e tudo tão bem conservado! Um lugarzinho diferente e especial. Conheci a secretaria de cultura de São Cristovão, Profa Aglaé, aposentada da UFSE, e conhecida e respeitada pelo trabalho que desenvolve há anos na cultura sergipana.

Como tudo estava em ordem, me dei ao luxo de passar parte da tarde sentada em um restaurante lendo as cem primeiras paginas de um dos livros que comprei. O “Clube do Filme” de David Gilmour. A história de um pai que, sem saber o que fazer com o filho adolescente que não consegue se adaptar ao colégio acaba propondo-lhe que largue a escola, desde que se comprometa a assistir com ele a três filmes por semana. E assim, ele vai, ao longo do livro, relatando sua tentativa de buscar uma educação não formal para o filho rebelde em plena crise de adolescência, a partir das lições que tira dos filmes que marcaram sua vida.

Quando retornei a praça, já era perto das sete horas e o povo começava a chegar. E, mais uma vez, foi surgindo gente de todos os lados até se fechar a grande roda com o povo se espremendo e subindo nas cadeiras para ver melhor o espetáculo. Esqueci de perguntar ao instituto Data- Japa a estimativa de publico para aquele dia, mas imagino que foi algo em torno de 500 pessoas ocupando aquela bela praça antiga. Noite linda, lua quase cheia e, finalmente, uma apresentação de encher os olhos. Ritmo, energia, constância, tônus, vigor e o publico se esbaldando de rir, completamente entregue a peça. Depoimentos calorosos no debate e contato com os grupos e com os artistas locais completaram a noite de uma das melhores apresentações que fizemos.

E chegou a quarta-feira: dia de folga. E que folga! Na verdade, o mais correto seria dizer: dia de festa do teatro nordestino!!! O fato é que depois de algumas tentativas frustradas de fazer contato com o pessoal do Imbuaça, finalmente, Lindolfo retornou a ligação de Renata Kaiser, e combinamos um encontro entre os três grupos. Eles estariam apresentando naquela noite na praça do Alto da Colina do Mateus a peça “O Mundo Tá Virado”, e estavam nos convindo para assistir ao espetáculo e depois fazer uma visita a sede deles que fica bem próximo do local da apresentação. Nós do Ser Tão, passamos o dia juntos na praia, já meio no clima de despedida, e eu mesma só sai do mar às seis horas da tarde, quando já estava escuro, para enfrentarmos uma correria danada para tomar banho, pegar um taxi e chegar a tempo na praça. A peça foi dedicada aos dois grupos: Ser Tão e Clowns e para nós foi um presente estar e ver um grupo tão conceituado, tão respeitado, provavelmente o grupo mais antigo em atividade no nordeste (e um dos mais antigos do Brasil), além de um ícone do teatro de rua brasileiro. Peça bonita, com ritmo, vigor e energia. Direção de Iradilson Bispo e com os outros três integrantes do grupo Lindolfo Amaral, Isabel Santos e Manoel Cerqueira em cena, acompanhados de vários outros atores convidados. E para completar a reunião de personalidades do teatro nordestino, contamos também com a presença de João Marcelino, que está em Aracaju para dirigir o novo espetáculo do grupo.

Eu, que ouço falar desse povo há mais de dez anos, mas ainda não os conhecia, fiquei que nem pinto molhado na chuva. Como é bom descobrir esses focos de resistência! Essa gente que fez e faz a historia do teatro contemporâneo no nosso país. E que receptividade eles guardavam para gente! Uma baita cervejada (com direito a whisky e tudo) na sede do grupo que foi tomada por posse há 18 anos atrás, e foi toda restaurada e conservada ao longo desses anos, com o dinheiro do caixa do grupo. E foi festa, viu!!!! Ser Tão (PB), Clowns (RN) e Imbuaça (SE) numa noitada de música, bate papo, teatro, e cerveja! Historias e mais histórias, encontros, coincidências, referências em comum....e, assim, fomos nos conhecendo. Festa que acabou depois das três da manhã, numa dança coletiva, e com um brinde mais que merecido de vida longa a esse que é um dos grupos mais respeitados do Brasil. Tomara que esse tenha sido apenas o primeiro de uma série de encontros.

Enfim: folga boa e histórica! Registrada pelas lentes atentas (mas aquela altura já meio embaçadas) do Cuca - nosso fotógrafo.

Quinta-feira: Mas agora chegou a nossa vez. Dia de apresentação em Aracaju. Galego as voltas com os imprevistos, uma peixada no almoço para dar ânimo ao povo, e saída às quatro horas da tarde para a Praça de Eventos da Orla, na Praia de Atalaia. Eu, mais uma vez, cheguei mais tarde, pois estou de partida amanhã e quero ver o grupo se virando sozinho. O que eles fazem muito bem, diga-se de passagem. Bom para eles e bom pra mim, que vou embora mais tranqüila. A fase pior para mim já passou. Foi a preparação para a despedida. Agora, é só uma questão de fechar as malas, ir embora e desejar toda a sorte do mundo para eles na Bahia, e nos projetos que estão por vir.

A orla de Aracaju é agradabilíssima e fora aqueles pepinos de sempre que fazem parte do processo, tudo correu na maior tranqüilidade. Duas TVs vieram fazer a cobertura, o publico (que tanto nos preocupava por ser Semana Santa) chegou em peso, e mais uma vez, tínhamos mais de 500 pessoas reunidas formando uma grande roda. Com uma lua cheia maravilhosa ao fundo e vários convidados especiais: a família e os amigos do Galego, amigos dos atores que moram ou estão por aqui, artistas dos vários grupos da cidade, e todo o elenco do Imbuaça, que cancelou o ensaio no dia para nos prestigiar.

E foi mais uma ótima apresentação. Tomamos um susto com Suellen, que passou o dia com uma tremenda crise de enxaqueca, mas que segurou firme até o final da peça, para então cair aos prantos e ir direto para o posto de saúde para ser medicada. Felizmente, foi só um susto e ela já está bem. São cinco e meia da manhã e alguns resistentes ainda estão em um luau na praia aqui na frente, misturados ao povo que conhecemos na sede do Imbuaça, e aqueles agregados que sempre aparecem, sabe-se lá de onde. E eu estou aqui postando esse testamento que é minha forma de me despedir. Coisas de quem está partindo... misturado, é claro, a um pouco de velhice, e uma falta de resistência e de saco para tanta festa!

Amanhã, é nossa ultima apresentação em Sergipe, mais uma vez na orla, já que pelo fato de ser feriado seria uma loucura tentarmos apresentar no centro da cidade que está totalmente deserto esses dias. E, na madrugada, eu parto para o aeroporto. E o presente tão intenso, começa a ganhar ares de passado, e em breve todo o cansaço ou desconforto da turnê, das pessoas, do excesso de agitação, vai começar a se transformar em saudade, saudade de uma experiência tão rica e tão forte. Que vai deixar marcas. Viva a Eletrobras! Viva a Funarte! Viva os nossos parceiros! Viva os Clowns! E principalmente, Viva o Ser Tão!!! Que apesar de novo, deu conta do recado, e já deixou marcado seu nome na historia do teatro nordestino.

E que a melancolia tome conta por mais um tempo até que, do nada, as imagens da próxima peça comecem a surgir, e tudo seja novo de novo!

Christina Streva

Partindo.

1 Comentários:

Às 3 de abril de 2010 às 10:29 , Blogger Gustavo França disse...

Ser Tão e Clowns, um caso de amor que deu certo... Viva o teatro!!! Evoé!!! Merda para todos!!!

 

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