quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

É 1O!!

Quinta-feira, 10 de dezembro. Quinto dia de trabalho. Ou seria o quarto, uma vez que o domingão de final de campeonato é sempre um domingo? Bom, já que estávamos todos lá, firmes e fortes (uns, como eu, mais firmes do que fortes) não tem porque negarmos tal dia de trabalho, né? Esse desejo de talvez tirarmos o crédito do domingo se dê para valorizarmos ainda mais a quantidade de coisas já vividas e levantadas até aqui, nesses poucos cinco dias. Ou seriam quatro? Ahhhhhhh!!! Vamos adiante.
Aos poucos, temos encontrado a nossa rotina de início de trabalho. A de hoje foi quebrada por dois motivos: o espaço já havia sido limpo antes, já que hoje foi dia de faxina no Barracão; e recebemos a notícia que finalmente, depois de tantas tentativas sem sucesso, fomos aprovados no edital da Caixa RJ, com o nosso Capitão. O Rio de Janeiro, que até muito pouco tempo esteve tão distante de nós, começa a se revelar como um porto mais familiar. Acho que a Cris Streva trouxe esse molho carioca pra perto da gente.
Comemorações à parte, regidos por essa alegria de notícias boas, hora de nos colocar em movimento. Thardelly, que tem assumido o início dos trabalhos, começou hoje com a “Saudação ao Sol”, já conhecido por todos e recentemente trabalhado por nós dos Clowns numa oficina tão transformadora que tivemos com a Professora Maria Thaís, em São Paulo. Minhas mãos e pés, que suam muito, comumente, me atrapalham bastante na execução deste trabalho. Foi assim também quando fiz pela primeira vez com Adelavane meses atrás. Me irrita um pouco não conseguir fazer por uma bobagem dessas. Ok, respiro...vamos em frente. Em círculo, fizemos um exercício que estimulava o uso de sons vocais aplicados a uma pulsação comum a todos e que envolvia todo o corpo. Depois de muitos atropelos, dúvidas, e até a tentativa de complicarmos ainda mais o que já estava sendo difícil naquele momento, sem esquecer das boas risadas, (pra variar) ficou claro que precisamos ajustar muitas coisinhas que se evidenciam em exercícios aparentemente simples. Precisão, concentração e foco, foram alguns deles. Acho que devemos começar a recorrer a alguns exercícios que fizemos até aqui. É preciso repetir para entendermos no corpo de uma forma mais direta. É interessante também observar a forma como as conduções e os jogos e exercícios propostos têm dialogado entre sim. Sinto que, não só temos falado a mesma língua, como estamos timbrando muito bem entre nós.
Foi a vez do Japa (é assim que normalmente me refiro a Fernando) assumir o trabalho. Fizemos uma sequência de movimentos, que agora não saberei dar o devido crédito. Não sei se veio da biomecânica ou da Yoga, ou até mesmo de uma terceira coisa que agora não me recorde. Mas, conhecemos através da oficina de Máscara Neutra citada agora há pouco, ministrada por Maria Thaís. São movimentos que trabalham as linhas vetoriais do corpo e que são fundamentais para o uso da máscara. E uma vez que temos tido como um referencial fundamental nesse processo o treinamento corporal a partir da técnica da comédia del’arte, esse certamente será um material muito bom de exploração e de trabalho técnico. Depois, divididos em dois grupos, seguimos num outro exercício aplicando o trabalho anterior a uma nova sequência: ouvir, ver e abraçar. O deslocamento pelo espaço se dá através da condução desses três verbos. Com um dedo eu aponto. Logo em seguida eu olho na direção em que apontei e por último, me desloco até esse ponto. Fizemos isso várias vezes. Quando conhecemos esse exercício, executamos sempre ao som de uma música mecânica, um estímulo externo. Fazê-lo hoje, em silêncio, pra mim, que tinha esse referencial, foi diferente. Movido por isso, propus que repetíssemos com alguns voluntários, agora ao som de uma estrutura rítmica constante tocada por mim numa Alfaia. Netto foi o primeiro, que acabou sendo levado pela pulsação externa, transformando o exercício quase numa coreografia. Isadora, a segunda, começou no mesmo registro que Netto, mas aos poucos foi imprimindo a sua pulsação interna necessária para executar seu deslocamento. Ao contrário de Isadora, que na segunda metade do percurso seguiu sem o estímulo externo da Alfaia, Renata iniciou em silêncio, ficando claro o quanto a presença do tambor, da pulsação externa, agora em silêncio, já havia contaminado a noção interna da pulsação. Não existe certo e errado nessas três situações. No entanto, assim reafirmamos mais uma vez que somos nós, o público, que temos que nos emocionar diante do que está sendo apresentado, não o ator/executante. Acredito que o trabalho através da música pode ser um organizador na percepção dessas coisas. Dando continuidade ao trabalho conduzido por Fernando tendo como base a experiência tão recente vivida por nós, Clowns, começamos a seqüência dos sete níveis de energia que se relacionam com o movimento. São eles: Exaustão (máximo de movimento com o mínimo de movimento); Relaxamento (usa-se a imagem do bêbado e/ou do bebê como referência); Economia (a energia suficiente para a realização de um movimento); Atenção (estado de alerta do animal, por exemplo); Decisão; Atitude e finalmente, Hipertensão (máximo de energia com o mínimo de movimento). Passamos gradualmente por esses níveis a partir do comando externo do um ao sete, até voltar ao um novamente. Falando em voltar ao estágio um, o da exaustão, esbaforidos fizemos nossa “santa” pausa.
Alguns bons goles de água, um cafezinho bem forte com um sanduíche que nos mata a saudade de nossa recém temporada em Sampa e um bolo da moça...ai ai ai, o meu preferido, bem quentinhooo!!Ahhhhhh, delícia!!! Não posso dedicar tantas palavras descritivas nesse parágrafo para não parecer que o nosso teatro é só um atalho para comermos em boa companhia, né? E boas companhias é o que não tem faltado nesses dias de trabalho prazerosos. Aproveitamos a pausa para começarmos a organizar o material e o espaço que precisaríamos para fazermos nossos workshops. O japa havia pedido que fizéssemos uma cena individual onde teríamos que pensar num produto para vendermos como comerciantes de rua, feirantes ou camelôs. Enquanto isso, eu esperava Titina chegar com o teclado que eu precisaria para fazer a minha cena.
Netto, com sua disponibilidade e ansiedade positivas, mais uma vez foi o primeiro a abrir os trabalhos. Com um portunhol divertidamente safado, encarnou um falso vidente que, através das cartas lia o futuro das pessoas. Isadora trouxe na sua vendedora o registro vocal e corporal da personagem Clarabela, explorado por ela em uma das leituras que fizemos coletivamente. Vendia itens de beleza com apelos sensacionalistas, fazendo referências a curas milagrosas através desses produtos. Renata, que também fez uma vendedora de cremes e cosméticos para homens e mulheres, optou em personalizar seus produtos com colagens bem toscas de fotos de celebridades recortadas de revistas de “futilidade pública”. Ela prometia deixar os clientes quase como um clone da celebridade referente ao creme usado. Picaretagem total! Suellen, muniu-se de uma calcinha única, caríssima mas com origem na Índia e que seria capaz de apaixonar qualquer homem que tivesse o prazer de ver alguma mulher usando-a. Vestindo um avental, com um timbre vocal interessante, Camille propôs quase uma bruxa que vendia velas bentas pelo padre, hora bentas pelo Papa Bento XVI. Mas o produto especial prometido por ela, uma vela mágica para embarcar sogras malditas teve pouco impacto diante de suas palavras. É importante destacar a participação constante de nós, público, sobretudo do Thardelly, um escada permanente que propôs muito nesse jogo com os vendedores que estavam em cena. Acompanhada de um ajudante imaginário, Lulu, uma força sobrenatural que se comunicava quase tomando conta de seu corpo, Maysa vendeu, ou melhor, deu para nós as velas dos sete pecados capitais. Relacionando-se diretamente com características entre um pecado capital e um de nós, ela apresentou uma cena muito divertida, digo, ela e Lulu, claro. César vestindo um figurino (que ele disse ser dele, o que faz disso suspeitoso)...bom, voltando, tenho que admitir, o amigo “pequeno” trouxe uma proposta muito bacana e, literalmente dos pés à cabeça e com direito a óculos, chapéu e corrente de prata. Brinque! Trazendo a ideia de criar a expectativa no público antes de revelar seu produto, ele compôs um tipo muito interessante com ações físicas que se repetiam juntamente a um quase jargão, “moderno”. Ao revelar os seus cordéis, foi quem primeiro teve uma abordagem mais direta conosco no que se diz respeito a vender o seu produto. O homem-da-cobra, figura que vimos num vídeo trazido por Netto há dias atrás, apareceu na cena de Thardelly. Usando uma cobra feita de pano retorcido e um banquinho indígena em formato de sapo que muito já nos serviu pra tantas coisas antes, esse homem-da-cobra-pastor-picareta (ops! Há alguma redundância aqui, não?) vendia pão da Santa Ceia, água que batizou Jesus, fumaça da anunciação do Papa e até a maçã com mordida de Adão e Eva. Tudo isso com ações físicas e palavras repetidas, o que é ótimo para a comédia, linguagem que popular que estamos estudando nesse processo e que tanto tem a ver com a comédia del’arte. Eu, que fiquei por último enquanto aguardava Titina chegar com o teclado, vestido com um paletó, camisa quadriculada e um chapéu Panamá usado por Cesar no falecido Roda Chico, relembrei os velhos tempos de “tocador de teclado de recepção”. Optei por um tipo meio locutor de lojas de varejo, facilmente encontrado nas lojas do centro da cidade e que com uma voz muito canastrona, cantando “Fogo e Paixão”, de Wando, vendia calcinhas de todos os tamanhos. Os textos de venda eram ditos nos intervalos entre uma frase e outra da música, tocada e cantada muitas vezes erradas. Bom, a ideia era ótima...se vocês tivessem visto como era na minha cabeça...putz! Incrível! Ai ai...
Passado esse momento que rendeu muitas risadas a todos, fizemos um fechamento avaliando o trabalho de hoje. Cris começou falando, uma vez que ontem ela saiu do Barracão com a cabeça a mil e depois de ter dito poucas palavras. Muito inspirada com as imagens que começam a povoar nosso imaginário, seja através dos livros ou até mesmo das coisas que vamos falando e alimentando nosso juízo (se é que ainda nos resta um) como por exemplo, a dos sobreviventes de hoje e aqueles dos mercados medievais. Cito aqui algumas palavras e frases ligadas ao trabalho de hoje de uma forma mais geral e dos workshops realizados por nós.
· O produto que está sendo vendido deve ter uma relação com a peça ou não?
· Os elementos que compõem os exercícios podem ser divididos em três partes para facilitar nossa análise de compreensão: o tipo (personagem), a ideia/produto e a forma de abordar esse produto (venda).
· Na grande maioria, a forma de abordar o produto dependeu muito da palavra
· A repetição de palavras e gestos está muito ligada aos aspectos da comédia
· Esquecemos de algo fundamental: é preciso vender de verdade!!! Esses camelôs sobrevivem da venda!
· Os múltiplos olhares que começamos a propor através do caminho que optamos é muito contemporâneo
· Não podemos perder o GROTESCO de vista

Depois de negociarmos muito tranquilamente uma santa folga no domingo, de anotarmos as tarefas de casa para segunda, finalmente brindamos com Champagne francês fabricado em Pernambuco e comprado na padaria da esquina, bebidos em chiques copos de plástico ao som de um quase inexistente “pec-pec” (plástico com plástico) ao trabalho, às conquistas e às parcerias felizes. Por hoje chega. Afinal, apesar de encerramos o dia uma hora antes, nós dos Clowns seguimos adiante com a segunda parte de nossa longa reunião administrativa de fim de ano. Ui! Coragem, é preciso camaradas!
Hasta la vista!

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