domingo, 6 de dezembro de 2009

Ponta Pé !!!

Como responsável pelo relato do primeiro dia inicio assolado pela dúvida: Como proceder? Faço um relato técnico, pragmático e objetivo, ou dou margem as minhas questões, escancarando a pessoalidade do olhar sobre aquilo que relato? Depois de uma breve reflexão concluo que a ponderação deve ser buscada. Acho que um meio termo é a decisão mais prudente. Então, ao relato.

Cheguei cedo, uns quinze minutos antes. Estava temeroso em ser o primeiro porque estava sem as chaves da sede. Felizmente vejo a porta aberta e a moto de Cuca, que possivelmente irá fotografar esse processo que se inicia. Além de Cuca encontro Arlindo, nosso secretário, Rafael e Camille. Faço as devidas saudações e vou para o escritório checar meus e-mails. Pelo vidro da sala/aquário vejo alguns dos integrantes do Ser Tão chegando. Fecho o navegador e vou saudá-los. Nessa leva chegaram Chris, que junto com Fernando será minha diretora nesse processo, Suellen, Isadora, Maisa, Augusta e Thardelly. Sentamos a mesa para colocar a conversa em dia. Logo depois chegam Fernando, Marco e Renata.

Com quase todos reunidos pela primeira vez uma excitação toma conta do espaço e demoramos um pouco até controlar os ânimos e sentarmos todos à mesa. Como se não bastasse uma televisão é providenciada para que se acompanhar os momentos finais da decisão do campeonato brasileiro: Flamengo e Grêmio. Marco e Thardelly vão para frente da TV enquanto Chris abre os trabalhos tratando de questões relacionadas à produção. Ela faz uma breve explanação sobre as dificuldades de compor a planilha e formaliza uma proposta de trabalho para Cuca e Rafael. Cuca é convidado a fazer a cobertura fotográfica do processo e da circulação nas vinte e uma cidades do nordeste por onde devemos circular. Cuca topa e fecha com o projeto apesar de deixar alguns detalhes para serem resolvidos depois. Chegada à vez de Rafael ele escuta atento a proposta que é feita, mas alega que o projeto se estenderá por um tempo demasiado e por isso precisa de um tempo para poder se pronunciar com sensatez. Nesse meio tempo o Flamengo é campeão brasileiro.

Enquanto o Flamengo se consagrava chegaram os últimos participantes. Renata Mora, produtora, e Neto. Esse último ainda ofegante e de mala na mão. Agora com todos à mesa, os ânimos menos eufóricos, começamos a tratar objetivamente do desafio que temos pela frente: Montar a Farsa da Boa Preguiça, do mestre Ariano Suassuna, com um elenco misto formado pelos integrantes do grupo Ser Tão Teatro de João Pessoa e dos Clowns de Shakespeare de Natal, no prazo de três meses. A direção também será compartilhada pelos diretores dos dois grupos, Chris Streva e Fernando Yamamoto. Chris começa transferindo oficialmente a produção para Renata Mora, depois coloca à mesa todas as suas impressões momentâneas sobre o que a devir. Ressalta que seu interesse maior não é no texto, mas sim no processo e no trabalho do ator. Fala de algumas idéias que tem para a montagem como a questão dos deuses e demônios serem as mesmas pessoas e de entender que tratar dos vícios do homem pode ser uma boa porta de entrada para a abordagem do texto. Também propõe que o Manual Mínimo do Ator, de Dário Fo, seja um norteador para o nosso trabalho.

Fernando fala em seguida após a alegação de Chris que só ela tinha posto as cartas na mesa. O diretor Clownianiano fala dos seus desejos e impressões e rememora André Carrera com sua proposta de intervenção na silhueta urbana. Diante disso já propõe uma estrutura que nos transforme em camelôs, assim como o texto sugere, e que daí possamos articular nossa estrutura técnica e cenográfica, como por exemplo equipamentos de som de uma boca, desses com que passam na rua vendendo picolés, pamonhas, entre outras coisas (traga a vasilha!!!). Por último, Fernando ressalta os paradoxos que deverão permear o trabalho: pressa e calma. Dois grupos que nunca trabalharam juntos, numa proposta desafiadora e pioneira de montar um espetáculo em um curto período de tempo, para isso era preciso pressa e calma, simultaneamente. Fernando e Chris, ambos, lembraram que este será um desafio histórico para o teatro nordestino que poderá apontar novos formatos de troca, parceria. Finalizando sua fala de abertura Fernando fala da necessidade do registro e Chris lembra que o blog para receber os relatos está sendo providenciado. Define-se então que cada um deverá ficar responsável por relatar um dia desta primeira etapa. Eu fico com o primeiro dia e a lista que segue é a seguinte: dia 07 Thardelly, 08 Renata Kaiser, 09 Suellen, 10 Marco, 11 Isadora, 12 Camille, 13 Maisa, 14, Fernando, 15 Neto, 16 Chris. Ficam faltando ainda 4 dias para chegar até o dia 20 de dezembro, nesse meio tempo esperamos que alguém crie vergonha na cara e peça voluntariamente para relatar os dias restantes.

O elenco, mesmo provocado, se manifesta timidamente. Ficamos mais no campo das dúvidas e esclarecimentos. Sem muita conversa e com o silêncio que ameaça se instaurar seguimos para o tablado para termos nosso primeiro momento em sala de trabalho. Como é um costume nosso, dos Clowns, com panos e baldes na mão fizemos a limpeza do espaço. Depois Thardelly assumiu os trabalhos e propôs um exercício onde ficamos dispostos em círculo e um que era escolhido para iniciar pedia permissão a uma segunda pessoa. Dada a permissão o primeiro caminhava até o lugar do segundo. O segundo, antes que o primeiro chegasse até ele, deveria obter a permissão de um terceiro e caminhar até ele, e assim sucessivamente. Essa comunicação de permissão e autorização era feita apenas com um discreto movimento de cabeça.

Marco toma do coletivo agora e coloca para o grupo um exercício que aprendemos com Dagoberto do Folias (SP). A partir de uma melodia simples ele finaliza uma seqüência musical com três palavras onde o coletivo deve responder com palavras que são convencionadas como opostas. Por exemplo: se ele diz sol, sol, sol, devemos falar lua, lua, lua. Se ele fala sim, não, sim, devemos responder, não, sim, não. Mais adiante, misturas são feitas, o que vem a dificultar o exercício: sol, quente, bota, e o coletivo responde, lua, fria, tira.

Thardelly volta a assumir o grupo e propõe uma dinâmica onde todos caminham pela sala e ele segura uma sandália em uma das mão. Ele então ordena que parem: todos param. Ele diz foco e todos olham para a sandália. Repulsa, ele fala, e todos repulsam o objeto sem sair do lugar. A repulsa deve ser externada com toda a estrutura corporal. Depois desejo, da mesma forma. Por último ele diz “pega!”, e aquele que primeiro pegar a sandália passa a dar os comandos.

Ainda com Thardelly fizemos um jogo de pega-pega onde todos só podiam correr de joelhos colados. Um era destacado para ser o pegador. Os demais fugiam e, se fossem pegos, ficavam congelados. Se alguém passasse por baixo das pernas de um “congelado” esse seria salvo. Se dois se abraçassem não poderiam ser pegos. Fizemos uma rodada dessa brincadeira. Na segunda e última rodada Thardelly deu um jeito de nos fazer crer que todos éramos pegadores. Foi uma bagunça só.

Por fim, o Ser Tão nos apresentou um trabalho que eles estavam desenvolvendo para a criação de matrizes a partir da fusão da partitura corporal de dois bichos. Suellen, Maisa e Isadora fizeram uma demonstração. Suellen foi mais além e mostrou um monólogo que ela estava desenvolvendo a partir da composição de sua matriz. A partir dessa demonstração e da apresentação do trabalho de Suelem, que utilizou também texto e técnicas de Dário Fo, Chris pôde fazer algumas ponderações e comentários sobre caminhos e desdobramentos que poderíamos utilizar para a feitura do nosso espetáculo.

Esse foi o primeiro dia de um processo que ainda não sabemos como e quando irá findar. Merda a todos.

Feliz por ser um participe desse grupo plural.

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